data-filename="retriever" style="width: 100%;">Gostaria de ter uma linda história de Natal para contar às pessoas, ainda mais nesta data, quando todos querem ouvir só notícias boas para esquecerem dos problemas do dia a dia. Infelizmente, não tenho uma boa história, assim como não tenho nenhuma notícia maravilhosa capaz de tocar o coração das pessoas, para dar-lhes um pouco de felicidade, especialmente, neste ano, em que, nos próximos dias, não teremos novos governantes para depositarmos nossas esperanças de dias melhores e mais tranquilos, com segurança, empregos, assistência à saúde e com o pagamento, em dia, dos salários.
No entanto, mesmo diante de todas as dificuldades, continuo gostando do Natal, pois tenho lindas memórias de infância, quando meus pais, meu irmão e eu passávamos quase um mês pintando lâmpadas queimadas e fazendo enfeites de isopor para pendurar no pinheiro, de mais de três metros de altura, que tínhamos no jardim, à espera da grande noite. Era outra época, os dias pareciam mais longos, o tempo passava mais devagar e tudo parecia mais simples. O Natal era tão importante quanto uma festa de casamento e cada presente recebido era muito valorizado, muito diferente de hoje, onde quase tudo é efêmero. São essas recordações que fazem com que a criança que habita em mim, nesse período, ressurja com toda a força. Essa criança lembrou de um Natal, há muitos anos, em que ouviu um poema de Carlos Drummond de Andrade, cujo título é Organiza Natal, no qual o ano seria invertido e teríamos mais meses perfeitos de Natal.
O poema diz: "... para a melhoria do homem, não parece absurdo imaginar que o ano inteiro se converta em Natal, abolindo-se a era civil, com suas obrigações enfadonhas ou malignas. Será bom. Então nos amaremos e nos desejaremos felicidades ininterruptamente, de manhã à noite, de uma rua a outra, de continente a continente, de cortina de ferro à cortina de nylon - sem cortinas. Governo e oposição, neutros, super e subdesenvolvidos, marcianos, bichos, plantas entrarão em regime de fraternidade... Os bens serão repartidos por si mesmos entre nossos irmãos, não haverá mais cartas de cobrança, de descompostura, nem de suicídio... O correio só transportará correspondência gentil... Toda pintura, inclusive o borrão, estará a serviço do entendimento afetuoso... Uma palavra será descoberta no dicionário: paz... O trabalho deixará de ser imposição para constituir o sentido natural da vida, sob a jurisdição desses incansáveis trabalhadores, que são os lírios do campo... Salário de cada um: a alegria que tiver merecido... Nem juntas de conciliação, nem tribunais de justiça, pois tudo estará conciliado na ordem do amor... Todo mundo se rirá do dinheiro e das arcas que o guardavam, e que passarão a depósito de doces, para visitas. Haverá dois jardins para cada habitante, um exterior, outro interior, comunicando-se por um atalho invisível... A morte não será procurada nem esquivada, e o homem compreenderá a existência da noite, como já compreendera a da manhã... E será Natal para sempre".
Passados muitos anos, a criança ainda não viu o Natal se organizar, mas ela continua acreditando. Feliz Natal!